Nunca, como sempre…

espera

Pois é… mais uma vez estive ausente daqui por muito tempo e não sei nem como recomeçar. Bom, vou direto ao assunto, o que facilitará muito a minha vida nesse início de 2013.

Eu tenho uma sobrinha de 21 anos. Não é bem minha sobrinha na verdade, é filha de um grande amigo, mas ela e todos os irmãos me chamam de “tia” desde que eram pequeninos… e confesso que acho fofo quando isso acontece.

O fato é que, nos últimos dias, tenho convivido muito com eles e voltei no tempo ao ver que ela está com questões muito parecidas com algumas que eu tive, quando eu tinha mais ou menos a idade dela.

Na época, liguei pra uma grande amiga e desabafei por um bom tempo ao telefone. Logo depois, a querida ouvinte escreveu uma crônica e a dedicou a mim. Emocionada, guardei cada palavra com todo cuidado e tempos depois, como se ouvisse um bom conselho, decidi que jamais deixaria uma oportunidade passar sem que eu tentasse ser feliz. Mesmo que no fim eu quebrasse a cara e sufocasse de dor, ir atrás do que eu acreditei sempre me fez crescer.

Para Ailim, minha sobrinha, e a quem mais interessar possa, abro os trabalhos desse ano compartilhando aqui o texto que há 13 anos carrego comigo.

Marina Martinelli, muito obrigada!

*****

NUNCA, COMO SEMPRE.

(Docemente dedicado aos mais de 40 minutos ao telefone com Renata Celidonio)

Isso não é mais medo de compromisso, já é um compromisso com o medo, foi o que ele se disse. Cento e sete minutos. Quatro letras, começa com A, sinônimo de baú. Ocupado. As relações mais inesquecíveis não têm nome. É preciso parar de fumar porque pode ser que um dia morra. E se você não fuma há a perspectiva de vida eterna. Cento e cinco minutos. Nada vale mais do que vinte segundos de reflexão. Reflexão. É mostrar as coisas iguais só que ao contrário e para o lado oposto ou para a coisa mesma. Dez diabinhos racionais em cima do muro, se um cai, ai se cai algum no chão, serão nove diabinhos racionais em cima do muro. Quando ela crescer ela quer ser um narrador onisciente para saber como acaba a história e nunca se envolver. Ele quando crescer quer ser um assassino de psicólogos. Nove diabinhos racionais em cima do muro… A-R-C-A … Ocupado. Fugindo como Joãozinho e Maria, só que trazendo consigo os pássaros devidamente instruídos para comer as migalhas que deixa só por desencargo de consciência. Cem minutos e pra que tanto drama já que ela sabe bem e ele também sabe bem que essa é a única solução cabível. Os amores bonitos estão condenados. Qualquer pessoa que lê sabe disso. Amor vivo é amor morto. Balela. Ele sabe. E é por isso que parte. Ele a ama. Ela o ama… e quem precisa de melhor razão para abandonar? Ocupado. Antes que ele se decepcione e que ela se decepcione e que os dois comecem a achar que sempre estiveram errados. Mega Star casa com Pop Star que está com um hit na parada de sucesso, recorde de vendas. Oito diabinhos racionais em cima do muro. Cada minuto é mais tarde e mais longe e mais urgente. Não há motivo e não há porque haver motivo. Quem precisa de motivo é crime. De tanta lágrima, cada olho seu parece uma folha de papel reciclado. Nem crime. Não há coisa que meta mais medo que felicidade. Nem Deus, nem inflação. Felicidade todo mundo quer e todo mundo que você conhece já teve, já sentiu. Há uma daquelas bombas de petróleo da garganta dela porque ele vai embora. Ela conta as gotas de adoçante. Ela não entende. Ocupado. Ela afoga a colher no café e deixa o café tonto. Não consegue estar triste porque não consegue acreditar. E como? Como ele. Sua mente está mais seca que um útero aposentado… seca, murcha. Qualquer música que toque faz sentido e é trágica e tem a ver. Ele olha para o ralo da pia e a água e o giro. Ele queria morar numa dessas máquinas de ar quente. Ele escuta o apelo num inglês incompreensível. Há um cubo de gelo morando no estômago dele porque ele vai embora. Ela olha as páginas de várias coisas, de catálogos, de livros, de listas, de cadernos, mas as letras se rebelam e flutuam indecifráveis. Ela observa o cruzar de pernas dos ponteiros do relógio. Setenta minu… sententa minutos, ele pensa. Uma coca sem gelo. Tudo desancora. No fim o importante é ter vivido e ter assunto pra contar aos netos e aos jornalistas, se diz e se repete como se acreditasse. Ocupado. Ele acha que não tem que explicar nada, que tudo está muito claro. Ela acha que sabe qual é a razão, mas não é possível que a razão seja essa. Ela acha que sente a falta dele e que depois dele… ele acha que sente a falta dela e que depois dela… Sete diabinhos amarrados num poste, uma banda de pífanos e três crianças com dor de ouvido se debatendo como peixe seco no chão de um shopping. Mais um motivo. Há. No fim de tudo não há de fato a partida. A ideia dele nela é como a música da taboca, a ideia dela nele é como a música do camarão sem casca e sem cabeça. Agora só faltam quinze. Ocupado. Ela podia sair do jeito que está, correr, impedí-lo, salvar o mundo. E envelhecer a seu lado cortando os pelos do seu nariz. Ele podia não ir, voltar, surpreendê-la, salvar o mundo. E envelhecer a seu lado mudando suas fraldas de incontinência. Qualquer pessoa sabe que amor vivo é amor morto, tudo o que é moderno é laranja e que o único “com” que leva a algum lugar é aquele que termina uma frase eletrônica iniciada por “http”. Anos noventa. Ele não sabe o que tem a dizer. Ela observa o gancho. Como tatuagem tribal, um no outro, sem fazer sentido. É a hipótese que dá corda no mundo. E decerto serão felizes, vivendo de como teriam-se amado.

(Marina Martinelli)

2 Respostas to “Nunca, como sempre…”


  1. 2 marielfernandes 15 de maio de 2013 às 10:58 PM

    Que lembrança boa. Super emocionante


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